Neste contexto desafiante que atravessamos, com a inflação instalada e a subida das taxas de juro, discutir sobre quais são as perspetivas para a economia, ou o que se pode esperar dos promotores e investidores imobiliários neste contexto adverso, é de extrema pertinência. Foi neste sentido que se realizou a conferência “Perspetivas económicas e desafios ao mercado imobiliário. Custos de construção e outros temas”, coorganizada pela CBRE, pela Ci e pela VI, no segundo dia da Semana da Reabilitação Urbana do Porto.
Na primeira intervenção da sessão, Ana Paula Serra, Board Member do Banco de Portugal, projetou as perspetivas macroeconómicas para Portugal para o restante do ano e, principalmente, para 2023. Em 2022, destacou o crescimento do PIB nominal e real «absolutamente excecional, acima das melhores expetativas», referindo que o «PIB ultrapassou o nível pré-pandemia no primeiro trimestre e houve uma relativa estabilização nos trimestres seguintes. Estima-se que no final do ano esteja 2,7% acima do valor pré-pandémico».
A resiliência da economia portuguesa
A representante do Banco de Portugal reitera que os dados mais recentes «confirmam que a economia portuguesa tem sido bastante resiliente, por via das famílias, certamente pela baixa taxa de desemprego e pela poupança acumulada nos dois anos da pandemia». Todavia, atenta para o facto de «o investimento em habitação já está a abrandar este ano e a evolução do investimento em construção sofre de um contexto de constrangimentos, desde a falta de mão de obra até ao aumento dos custos dos materiais, por exemplo».
Para 2023, Ana Paula Serra indica que «antecipa-se um crescimento modesto do PIB a nível mundial e uma rápida redução da taxa de inflação, algo que nos diz a Comissão Europeia, com uma maior normalização na cadeia de abastecimento».
Para Ricardo Guimarães, Managing Partner da Confidencial Imobiliário, o sentimento do mercado, dos próprios operadores, «é conservador», contudo refere que, até à data, «não encontramos essa realidade no mercado: vemos o Índice de preços da habitação a subir 19%, um número bastante acima da realidade de 2019». Por intermédio de dados adquiridos, indica que o «mercado que está a contribuir mais para a queda do número de transações é o mercado de promoção nova, onde se observa uma queda no número de vendas. No entanto, se analisarmos por de trás deste número, constatamos uma contração muito significativa e consistente da oferta».
“Uma pressão do lado da procura sobre a oferta”
Ricardo Guimarães considera que «o grande problema que o mercado enfrenta hoje ainda é uma pressão do lado da procura sobre a oferta». O Managing Partner da Confidencial Imobiliário assinala que «desde janeiro de 2022, identificamos 176 novos empreendimentos em projeto na área metropolitana do Porto. O Porto destes 176 tem 33 e Gaia soma 63», ou seja, considera que «o mercado está de facto a reconfigurar-se e, talvez, umas das estratégias que as famílias têm para resolver a pressão entre o seu rendimento e o preço é a geografia, ou seja, a variável de ajustamento não é o preço nem a quantidade».
Numa ótica do mercado de investimento em Portugal, Rui Moreira, Director - Head of Porto da CBRE Portugal, referiu que o «3º trimestre foi extraordinário: alavancou um ano que não começou bem. O último trimestre deverá manter dinâmica», destacando o setor logístico, «com um record de investimento», e o setor de hotéis, «que pode ter um ano histórico».
“Porto tem vindo a ganhar peso”
Rui Moreira constata que o Porto «tem vindo a ganhar peso»: em 2021 representou 15% do investimento total em Portugal, sendo que este ano «andamos por volta dos 17%» e uma «absorção líquida de espaços elevada». Salientou ainda o posicionamento da cidade no mercado internacional na atração de serviços partilhados, R&D e empresas tech. Para Rui Moreira, os «novos projetos e centralidades deverão impulsionar os valores sem que a região perca competividade a nível ibérico».
Mesa-redonda de debate
Em termos de investimento, Nuno Nunes, Senior Director - Head of Capital Markets da CBRE Portugal, considera que «o copo está completamente cheio: se olharmos para o volume total de investimento, há a expetativa de que este ano haja um investimento a rondar os 3 mil milhões de euros, um dos melhores anos de sempre. E, cerca de 80%, será feito por investidores estrangeiros. Continua a ver um grande interesse por parte de estrangeiros».
Por outro lado, o responsável sublinha que «estamos num processo de ajustamento do valor dos ativos, que decorre do contexto, mas particularmente de uma alteração do contexto do mercado financeiro, que faz com que o preço destes ativos seja diferente. É um processo que só estará concluído quando houver uma estabilização da inflação e de uma definição maior no contexto geopolítico».
O facto de «muitos players e operadores internacionais quererem entrar e expandir» em Portugal, pode ser uma forma de «mitigar parte destas nuvens negras que atravessamos». Para Nuno Nunes, «fator geopolítico está no centro da agenda de muitos investidores: Portugal é visto de uma forma muito favorável dentro do contexto europeu».
Alexandre Fernandes, Executive Director, Developments – Europe da Sonae Sierra, reitera que «a teoria diz-nos que todo este aumento das taxas de juro, e o aumento da inflação, vão provocar o aumento das yields e da rentabilidade que os investidores estão a pedir. E nós subscrevemos isso: consideramos que, a curto-prazo, as yields vão subir». No entanto, o responsável considera que «no mercado de qualidade mais elevada, onde atuamos, acreditamos que as yields vão subir, mas julgamos que no médio-prazo vamos conseguir atenuar esse crescimento».
Artur Varum, CEO da Civilria, revela que «estamos moderadamente otimistas. A procura continua a existir, o mercado vai continuar a crescer com esta atratividade que o Porto tem conseguido em termos internacionais». Alude ainda para o facto de o investidor ter em conta o fator preço: «este fator é determinante e acabam por ocupar Maia, Matosinhos, Gaia etc. Depois também temos polos satélites, como Braga e Aveiro, que começam a ter alguma dinâmica e acabam por absorver alguns metros quadrados com áreas significativas».
“Somos obcecados por criar neste Porto”
Pedro Pinto, Administrador da Lionesa, ratifica que na empresa, com mais de 7 mil trabalhadores, «somos obcecados por criar neste Porto» e que «ajudamos a importar empresas para o nosso território». O Administrador da Lionesa indica ainda que «vamos fazer o possível para não aumentar as rendas. Neste sentido, gostávamos que as empresas aumentassem os salários».