O número de casas disponíveis no mercado é escasso e, também, inacessível para boa parte dos portugueses. A resposta a este desafio passa pelo aumento da oferta e, para isso, é preciso incentivar a reabilitação urbana e promover a construção nova.
Neste sentido, a colaboração dos setores público e privado é elementar. A conferência "Lisboa – As novas centralidades e as oportunidades de investimento", promovida pela Câmara Municipal de Lisboa e a APPII, viabilizou o debate destas questões na Semana da Reabilitação Urbana de Lisboa..
Lisboa tem potencial para ser uma cidade dos 15 minutos?
Dando início à sessão, Hugo Santos Ferreira, Presidente da APPII, lançou a questão: «terá Lisboa potencial para ser uma cidade dos 15 minutos? O que precisamos fazer para chegar a esse desígnio?».
A primeira apresentação da conferência prendeu-se, precisamente, nesta questão. Joana Almeida, Vereadora do Urbanismo, dos Sistemas de Informação e Cidade Inteligente, e da Transparência e Prevenção da Corrupção da Câmara Municipal de Lisboa, deu conta que a Câmara de Lisboa tem uma equipa a trabalhar a cidade dos 15 minutos: «o programa Há vida no meu Bairro pretende executar este conceito, onde funções urbanas essenciais podem estar a um intervalo de 15 minutos a pé».
“Aplicar este urbanismo de proximidade”
Segundo a vereadora, o desafio passa por «aplicar este urbanismo de proximidade, promovendo deslocações pedonais». Os objetivos passam por reforçar a identidade de bairro, promover a qualidade de vida, a segurança e o conforto, bem como fomentar uma mobilidade ativa. «O Programa procura que todas as funções urbanas essenciais estejam presentes nos bairros: comércio, escolas, saúde, espaços verdes, comércio, desporto e lazer».
José Almeida, Regional Manager & Commercial Director da Confidencial Imobiliário, foca-se nas qualidades de «LisBOA» e no potencial da capital portuguesa. Lisboa «tem uma representatividade de investimento estrangeiro muito diferente das outras, uma vez que a quota de compradores internacionais na capital situa-se entre os 29% e 30%», aponta o responsável.
É uma «cidade excelente, de diversidade, aberta ao mundo, cosmopolita. Isto vem trazer uma nova dinâmica à cidade», acrescentando que «Lisboa tem tido um desenvolvimento positivo, sendo necessária uma acoplação: é fundamental desenvolver um trabalho de eficiência em processos como o licenciamento e a qualidade urbana».
“ É notório o trabalho que está a ser feito para trabalhar este conceito”
Na mesa-redonda de debate, Paulo Pardelha, Diretor de Departamento de Planeamento Urbano, Câmara Municipal de Lisboa, destacou o «trabalho notório» que está a ser feito para trabalhar este conceito, que já teve «resultado no passado, como por exemplo o Bairro de Alvalade». Paulo Pardelha atenta ao facto de o conceito estar «ligado a uma noção de sustentabilidade, que é um desafio da cidade de Lisboa e das cidades no geral».
«É difícil termos uma cidade de Lisboa dos 15 min, se nos 18 municípios não for trabalhado este conceito, que não pode ser uma tendência apenas para a cidade, mas sim uma consciência social global», aponta o Diretor de Departamento de Planeamento Urbano da CML, referindo que os municípios e promotores estão «muito mais sensíveis para este assunto».
Ao designar as cidades como «um organismo evolutivo e vivo que vai assimilando estes novos conceitos», João Caria Lopes, Vogal do Conselho Diretivo Regional de Lisboa e Vale do Tejo da Ordem dos Arquitectos, indica que a cidade dos 15 minutos «nasce de uma série de críticas ao movimento moderno, que tinha esta ideia de criar bairros independentes que funcionavam sozinhos. Uma cidade que se interage entre si».
Lisboa tem a “ base certa” para ser uma cidade de 15 minutos
Para o responsável, Lisboa tem «a base certa» para ser uma cidade de 15 minutos: «em muitos bairros de Lisboa já se vive estas cidades dos 15 minutos», ou seja, «a base está cá, é continuar», sublinha.
Claúdia Beirão Lopes, Director of Licensing & Urban Planning da Reify, considera que, em Portugal, «fazem-se coisas com muita qualidade, muito bem feitas», mencionando os três projetos apresentados no período da manhã como exemplo destas coisas «bem feitas».
A responsável lamenta que a Confidencial Imobiliário não faça parte do Ministério da Habitação, pois se fizesse parte «seguramente as medidas que vêm no pacote da habitação, no que diz respeito a habitação acessível, teriam muito mais sentido», acrescentando que os «dados da Confidencial Imobiliário são muitíssimo claros de como se poderia fazer um caminho que era interessante para todos, ao invés daquilo que temos em cima da mesa, um caminho incerto».
Pode a intervenção privada ser um motor na cidade dos 15 minutos?
Ao ser questionada pelo moderador do debate, Hugo Santos Ferreira, Claúdia Beirão Lopes responde que «pode também, deve também e é também». A responsável explica que «não é possível investir numa cidade de 15 minutos, sem ser feita a parte da Câmara Municipal. Esta tem de dar mais visibilidade à política que tem nesta matéria da cidade dos 15 minutos».
A representante da Reify no debate enfatiza que «se todos percebermos melhor qual é o objetivo e o alinhamento da Câmara, teremos mais facilidade em estarmos alinhados», adiantando que «o caminho está a ser feito, há espaço para o diálogo» e que «da parte dos promotores começa a haver uma consciencialização de que isto é um trabalho em conjunto».
Joaquim Lico, CEO da Vogue Homes, nota que «quanto mais tempo o processo está em apreciação e avaliação, maior é o impacto financeiro que isso tem». O promotor quando vai investir «tem de tomar vários fatores em consideração e esse é um dos mais relevantes», admite, acrescentando que «isso vai ter um grande condicionalismo, principalmente no que é a habitação destinada à classe média. Quanto mais custo implementarmos, mais difícil é termos os preços acessíveis na habitação».
Considera que outro fator relacionado com a morosidade, «que pouco se fala», é a emissão das licenças de utilização. Joaquim Lico refere que por vezes, chegam a demorar 18 meses: «como é que um simples processo administrativo, por vezes, demora mais do que construir o próprio edifício? Este é um tema muito importante, pois introduz uma grande morosidade naquilo que é o ciclo do projeto».
No ponto de vista dos promotores, o CEO da Vogue Homes considera que a Câmara deveria «ter uma atenção especial a dois aspetos»: a uniformização da interpretação dos regulamentos municipais, que seria «uma linha condutora para os arquitetos, promotores e técnicos»; o problema não «reside apenas nas câmaras, há também o tema das consultas às entidades externas. Poderia haver aqui um procedimento, que a Câmara podia instituir, de aprovação tácita».
Simplex no licenciamento
O tema dos licenciamentos foi também debatido na conferência. Para João Pereira Reis, Partner da Morais Leitão, «na realidade, já vimos muitas mudanças legislativas, temos de ter presente que não é a lei que resolve tudo, há praticas e culturas instituídas que o legislador pode dar a voltas que quiser, que não vai resolver nada».
O responsável considera que «a demora na aprovação dos projetos não decorre apenas da lei: muitas das vezes os projetos estão mal feitos. Depois, a deficiente instrução dos próprios pedidos, faz com que muitas das vezes os processos sejam diferidos, pois faltam elementos». Reitera ainda que os técnicos municipais analisam, muitas vezes, uma «quantidade de matérias que não têm interesse nenhum», acrescentando que «o técnico tem de ir ao essencial para a tomada de decisão e, por vezes, não é isso que acontece».
Paulo Pardelha frisa que «é preciso percebermos os processos, onde estão em tempo real, conseguir eliminar redundâncias no processo de decisão».