A secretária de Estado da Habitação, Patrícia Gonçalves Costa, esteve esta quinta-feira na Semana da Reabilitação Urbana de Lisboa para apresentar e explicar a nova Lei dos Solos. Recorde-se que as alterações ao RJIGT, que permitem a reclassificação de solos rústicos como urbanos para construção de habitação, foram aprovadas na especialidade esta quarta-feira.
"Não se trata de uma nova lei dos solos"
A governante começou por esclarecer alguns pontos centrais: «Vou dizer-vos três coisas muito simples: em primeiro lugar, explicar-vos que não se trata de uma nova lei dos solos. Em segundo lugar, que não se trata de construir em solos rústicos. E, em terceiro lugar, procurar demonstrar porque consideramos que esta legislação poderá vir a libertar mais habitação e, sobretudo, habitação para a classe média».
«Ninguém mexeu na lei dos solos, mas sim no Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial», reiterou Patrícia Gonçalves Costa, acrescentando que «as novas soluções encontradas neste diploma enquadram-se totalmente no quadro da Lei de Bases da Política Pública de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo, consagrada na Lei n.º 31/2014, de 30 de maio. E porquê? Porque reafirmam a reserva da competência dos municípios em matéria de classificação do solo e vinculam-nos a esta responsabilidade», sublinhou.
"As normas do diploma são claríssimas: garantir que a reclassificação do solo urbano contribui, de forma inequívoca, para a consolidação das áreas urbanas, o desenvolvimento sustentável e a coerência territorial"
O objetivo da lei, segundo Patrícia Gonçalves Costa, é permitir que os municípios reclassifiquem terrenos de acordo com as suas necessidades. «Não se trata de construir em solos rústicos, mas sim de expandir aquilo que os municípios entendam ser a necessidade de criar solos urbanos, devidamente integrados e estruturados», afirmou, frisando que «não é uma questão de semântica, mas sim de rigor no procedimento».
Procedimentos mais ágeis para mais habitação
O Decreto-Lei n.º 117/2024 «não visou apenas promover a oferta de habitação pública e privada a preços acessíveis, mas também aproveitar esta oportunidade para criarmos uma cidade de qualidade, harmoniosa e integrada, de acordo com as necessidades definidas pelos municípios para os seus territórios», explicou a governante.
«Este diploma previa que poderia ser um instrumento para concretizar mais habitação, com foco no regime de renda acessível. Para isso, a primeira condição trabalhada foi a redução dos procedimentos e condicionantes, garantindo a eficácia em tempo real e a sustentabilidade das soluções», referiu, acrescentando que, «por isso, exigiu-se um procedimento de planeamento que permitisse a ponderação das várias áreas, garantindo simultaneamente celeridade e agilidade para que os resultados pudessem surgir num curto espaço de tempo».
Governo está "bem atento" à industrialização
Patrícia Gonçalves Costa sublinhou ainda que a construção de habitação não é um processo imediato e que o Governo está atento à industrialização do setor. «Sabemos que construir habitação não se faz em dez meses. Este Governo está atento e empenhado em garantir que a industrialização do setor nos permita, num futuro próximo, construir casas nesse prazo. No entanto, ainda não chegámos a esse ponto. É necessário otimizar recursos e toda a cadeia da construção para tornar essa meta uma realidade», evidenciou.
«É fundamental que os procedimentos legislativos que concretizámos possam convergir para uma resposta rápida», enfatizou, acrescentando que, por esta razão, «excluímos deste regime as áreas classificadas, as áreas de risco e as áreas nucleares da REN e da RAN». Contudo, «foi conferida a possibilidade de uma intervenção ponderada em algumas destas áreas, desde que seja possível garantir as suas funções essenciais. Infelizmente, as alterações promovidas em sede parlamentar poderão ter reduzido essa margem de ação».
Para garantir o equilíbrio entre rapidez e planeamento, foram excluídas da nova legislação as áreas classificadas, de risco e as zonas nucleares da Reserva Ecológica Nacional (REN) e da Reserva Agrícola Nacional (RAN). No entanto, foi aberta a possibilidade de uma intervenção ponderada em algumas destas áreas, desde que fosse possível garantir as suas funções essenciais.
Compromisso com habitação acessível e cidade integrada
A viabilidade económica dos projetos foi outro ponto destacado pela secretária de Estado, que lamentou a rejeição do conceito de habitação de valor moderado durante a votação parlamentar. «O objetivo desta proposta era tornar este exercício viável para os parceiros privados. Porque, sejamos claros: a crise da habitação que vivemos não se resolve apenas com o setor público».
Sobre o regime do arrendamento acessível, Patrícia Gonçalves Costa adiantou que o regime está pronto para a alteração ao PAA e para entrar no circuito legislativo, sendo que «o objetivo passa por introduzir maior celeridade e reduzir a burocracia, nomeadamente no HCC».
"70% de construção para habitação a valores moderados e 30% para serviços complementares"
A governante deu conta ainda de que o diploma previa uma lógica de 70% de construção para habitação a valores moderados, seja HCC ou habitação acessível, e 30% para serviços complementares. «O que são estes usos complementares? São o habitat, aquilo que torna possível a vida na cidade: escolas, comércio, serviços – tudo o que as pessoas precisam para viver com dignidade». Importa compreender que esta componente de 30% «representa uma mais-valia não só em termos de qualidade de vida, mas também como compensação económica e de oportunidade para que o setor privado perceba o papel estratégico que pode desempenhar», avançou.
A reclassificação dos solos será conduzida exclusivamente pelos municípios, que terão a responsabilidade de identificar as áreas com maior potencial e garantir que todo o processo decorra de forma simplificada. «Sendo a reclassificação 100% municipal, cabe a cada município identificar as suas necessidades e potencialidades territoriais. Selecionar as áreas com maior potencial, dialogar com proprietários e investidores e garantir que todo o procedimento simplificado esteja em conformidade com todas as cartas públicas que têm».
Apesar de algumas reservas quanto às alterações introduzidas pelo Parlamento, a secretária de Estado garantiu o compromisso do Governo em trabalhar em conjunto com todos os intervenientes para reforçar o investimento público e privado na habitação acessível. «Embora tenha algum receio que as alterações decorrentes agora da apreciação parlamentar possam de algum modo restringir o efeito pretendido, estamos aqui para transformar desafios em oportunidades. Só com a colaboração de todos conseguiremos reforçar o investimento público e privado na habitação acessível – e é exatamente isso que nos move».