Arrancou esta terça-feira a 12ª edição da Semana da Reabilitação Urbana de Lisboa. Perante uma audiência numerosa, a Secretária de Estado da Habitação, Patrícia Gonçalves Costa destacou a importância do evento «para se falar de cidade, porque é fundamental ter este momento de partilha de conhecimento para qualquer tomada de decisão. Foi nesta estratégia de diálogo que o Construir Portugal foi desenhado, com o objetivo de consolidar uma política pública de habitação».
«É importante que tenhamos a consciência de que uma casa sozinha não resolve nenhum problema de habitação; o bairro tem de estar inserido na cidade e no habitat. Isso introduz o conceito de dignidade, e é disso que estamos à procura», sublinhou, acrescentando que «o Construir Portugal se alicerçou no conhecimento multidisciplinar e na colaboração de todos os atores que interagem nestas temáticas».
"O Construir Portugal vem para desbloquear a oferta pública, o investimento privado e voltar a aquecer o motor da habitação"
A secretária de Estado da Habitação recordou que, nos últimos anos, o setor enfrentou desafios estruturais: «o valor do imobiliário disparou a partir de 2015, os custos aumentaram depois de 2020, há pouca mão-de-obra e muitas carências habitacionais. Temos 1,5 milhões de pessoas nesta situação e uma classe média incapaz de aceder ao mercado privado, com um perfil muito diferente da classe vulnerável de há alguns anos».
Para construir uma política pública de habitação, Patrícia Gonçalves Costa destacou cinco eixos fundamentais. O primeiro passa pela «remoção dos bloqueios da regulação», onde se inclui a revisão do regime do uso do solo, cuja decisão final será tomada «amanhã», e a alteração ao RJIGT, que prevê «70% desta construção como habitação com limite de preço e 30% para mercado livre ou usos conexos». Destacou ainda a importância da revisão do RJUE, prevista para o primeiro trimestre do ano, e do desenvolvimento do Código da Construção. «Estão a ser finalizados o regulamento do projeto de execução, os eurocódigos estruturais, os relatórios de vulnerabilidade sísmica, a estratégia nacional BIM, entre outros», enumerou.
O segundo eixo foca-se na «mobilização dos recursos públicos», através de parcerias para dar nova vida a imóveis devolutos do Estado e transferências para os municípios. O reforço da resposta pública, terceiro eixo, tem sido impulsionado pelo PRR e pelo programa 1.º Direito, com um regime de exceção recentemente aprovado.
Patrícia Gonçalves Costa referiu ainda a «criação de instrumentos eficazes de apoio», como a isenção de IMT e Imposto de Selo, a revisão do programa Porta Jovem 65 e o reforço dos apoios ao arrendamento. Por fim, frisou que «nenhuma política pública deve deixar de estar assente num suporte financeiro», sublinhando o trabalho em curso para reduzir a taxa de IVA na construção – «estamos a trabalhar com o ministério das finanças para concretizar a redução do IVA na habitação para venda, dentro dos limites europeus definidos».
Novo IFFRU terá vertente de reabilitação urbana
Entre as medidas em desenvolvimento, revelou que está a ser preparado «o novo IFRRU 2030, que terá vertente de reabilitação urbana, reforço sísmico e de financiamento à habitação acessível». O programa está a ser estruturado com o BEI, para garantir financiamento, e vai continuar a financiar as ações de reabilitação urbana dos edifícios privados promovidos por privados, cooperativas e 3º setor.
"Todos em conjunto temos de conseguir implementar uma política pública sustentável"
Patrícia Gonçalves Costa destacou ainda que «a habitação não tem nenhuma bala de prata, é um problema complexo», acrescentando que «muitas políticas têm de convergir na resposta de uma política pública de habitação. Todas as propostas do Construir Portugal convergem neste fim, principalmente o reforço da oferta. Cada um na sua vocação tem uma palavra a dizer na operacionalização destas políticas».
Setor imobiliário "é essencial para qualquer cidade"
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Na sua intervenção na abertura do evento, Carlos Moedas, presidente da Câmara Municipal de Lisboa, traçou um balanço dos três anos na Câmara Municipal de Lisboa, destacando que «o investimento feito em habitação foi único» e que, apesar dos desafios de financiamento, Lisboa conseguiu avançar com um programa ambicioso: «assinámos 560 milhões para habitação em Lisboa, com grande esforço, porque o PRR foi um engano para os autarcas, porque quem tem de colocar primeiro o dinheiro é a nossa tesouraria».
"A grande parte não foi construção nova, mas sim reabilitação urbana"
Carlos Moedas recordou que «temos tido uma década com muito pouca construção municipal. Quando criticam os privados, deviam lembrar-se de que o setor público nunca deu o exemplo: 29 casas por ano nos últimos 10 anos. Por isso, o público não pode dar lições ao privado, porque não cumpriu».
O autarca referiu que «temos um problema que não pode ter uma solução única, e foi nesse sentido que procurámos olhar para a cidade: criar mais oferta, não só através de nova construção, que demora vários anos. Quisemos também recuperar casas municipais fechadas e, atualmente, entregamos cerca de 30 chaves a cada 15 dias. Nos últimos três anos, foram 2.434 chaves – esse é o número de famílias a quem mudámos a vida. E, na sua maioria, não foi construção nova, mas sim reabilitação urbana: 1.800 fogos que estavam fechados e que recuperámos».
"A habitação é também o privado"
O privado «depende de um fator», enfatizou Carlos Moedas: «uma autarquia que funcione, que seja eficaz e eficiente. Quando chegámos, há três anos, havia mais de 3.000 processos parados na autarquia. Desde então, aprovámos mais de 10.000 fogos, cerca de 3.000 por ano, um aumento de 20% face ao passado».
O presidente da Câmara de Lisboa reforçou que «há um enorme potencial na cidade. A Carta Municipal de Habitação traduz esse potencial: analisámos uma série de projetos que estavam parados há anos, como o Vale de Santo António, com 2.400 casas num projeto de mais de 60 hectares, a Quinta do Ferro, que estava completamente abandonada, e o Casal do Pinto. Tudo isso é libertar potencial».
É urgente "dar um novo impulso" à reabilitação urbana
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Por outro lado, Manuel Reis Campos, Presidente da CPCI, destacou que a Semana da Reabilitação Urbana «distingue-se pela capacidade de reunir os principais intervenientes do setor para discutir temas como a habitação, a política da cidade, o PRR, a lei dos solos, construção sustentável, eficiência energética, entre outros. O evento tem sido um marco na promoção do desenvolvimento sustentável dos territórios».
Algumas das medidas já em curso do Executivo terão um impacto relevante, salientou Reis Campos, referindo-se à nova lei dos solos, que «permitirá construir em um maior número de espaços e terá o consenso dos maiores partidos políticos», e à revisão do Simplex, «que conciliará a simplificação com a garantia da qualidade construtiva». Na fiscalidade, destacou o «reconhecimento do Governo da necessidade de aplicação do IVA reduzido a mais obras de habitação. O compromisso do Governo nesse sentido é importante».
«Temos um compromisso de 59.000 casas até 2030. Este objetivo é uma oportunidade decisiva para aumentar a oferta do Estado, atendendo às necessidades das populações mais vulneráveis, fortalecendo o papel social do Estado», enfatizou o presidente da CPCI. «Precisamos de construção industrializada 4.0, que assenta na digitalização e automação, para aumentar a qualidade e sustentabilidade. Esta abordagem, combinada com outras soluções digitais, tem revolucionado a reabilitação urbana, tornando-a mais eficiente e alinhada com as exigências atuais, juntamente com materiais inovadores», inferiu Reis Campos.