A sessão “O caminho dos edifícios nZEB e o balanço de 25 anos de Política Energética em Portugal”, que decorreu na manhã do segundo dia da Semana da Reabilitação Urbana do Porto, colocou em debate o papel da certificação energética, a evolução do parque edificado e e o balanço de 25 anos de política energética em Portugal.
Na abertura, Bruno Veloso, vice-presidente do Conselho de Administração da ADENE, realçou que a Agência Nacional de Energia “tem trabalhado numa transição energética justa e solidária. Foi longo o caminho e são muitos os parceiros no imobiliário e na indústria”. Atualmente, “temos um grande desafio, a primeira etapa do processo de transposição da EBD”, referiu, acrescentando que “isto não se faz sem a participação direta dos stakeholders; adotamos uma postura ágil e colaborativa para sermos um verdadeiro catalisador das políticas públicas junto das pessoas”. Neste sentido, “mantemos o compromisso de apoiar todos os que se esforçam e de mobilizar todos os agentes, para obter os resultados de forma mais eficiente e mais rápida. O setor imobiliário tem sido setor de referência para a transição energética no nosso país”, acrescentou.
Seguiu-se a perspetiva da indústria, com Rui Oliveira, diretor-gerente da Saint-Gobain Glass Portugal, a destacar que os edifícios mais sustentáveis serão também os mais valorizados, defendendo a aposta na digitalização, na inovação e na neutralidade carbónica até 2050. “A nossa estratégia é comprometer-nos com a neutralidade carbónica até 2050, seguindo o barómetro da construção sustentável. Temos um plano Lead & Grow para a inovação sustentável, parcerias para descarbonização e uma aposta na economia circular e na produção local”, afirmou. Já Pedro Santos, diretor técnico da Reynaers Aluminium, apresentou o passaporte digital de produto DigiTrace, já aplicado no novo edifício da CGD, sublinhando que permite “rastrear qualquer material usado na construção, de forma totalmente digital, o que é importante para quem fabrica, instala e utiliza o edifício”. Explicou ainda que a plataforma “permite integrar inclusivamente o certificado do edifício”, oferecendo informação acessível ao longo de todo o ciclo de vida do imóvel.

Assinalando os 25 anos da ADENE, Rui Fragoso, diretor na Direção de Edifícios e Eficiência de Recursos da ADENE, sublinhou que “o certificado energético português tem vindo a evoluir e teve vários reconhecimentos externos”, referindo ainda que “foi importante para a definição da ELPRE, nomeadamente para a sua monitorização. Permite também avaliar as necessidades de investimento do parque edificado”. Recordou que existem benefícios fiscais em sede de IMI consoante a classe energética e destacou a nova diretiva europeia EPBD 2024, que traz “novos desafios e oportunidades” para o setor.

O caminho para edifícios nZEB
O debate, moderado por João Ferreira Gomes, Presidente da ANFAJE, trouxe ao palco diferentes perspetivas técnicas sobre o caminho para edifícios nZEB, com Vasco Peixoto de Freitas, professor catedrático da FEUP, a defender que procurar “balanço energético quase nulo nos edifícios novos é fundamental, tendo em conta a envolvente passiva e os equipamentos instalados”, lembrando que a transição “é fundamental mas com realismo, tendo em conta o nosso clima e as questões sociais”, insistindo na necessidade de pensar a eficiência dos equipamentos, a manutenção e o impacto a longo prazo. Admitiu ainda que, apesar de apreciar o certificado energético, o sistema “não é ideal para as famílias que precisam de aquecer mais intermitentemente as suas casas”.
Para responder às necessidades atuais, Vasco Peixoto de Freitas defendeu que, “para se construir respondendo às exigências atuais, não podemos pedir que o custo seja muito baixo”, pelo que é necessário “refletir sobre o nível de exigência que queremos”. Sugeriu, por exemplo, “um nível 1 e um nível 2, para que seja possível responder rápido”, garantindo sempre “as exigências mínimas”, mas encontrando “uma forma inteligente de oferecer o mínimo de qualidade, mas abaixo das exigências atuais”.

Já João Sousa, presidente do Colégio de Engenharia Mecânica da Ordem dos Engenheiros Técnicos, defendeu que o setor “tem de ter um papel colaborativo com todas as outras entidades”, propondo mesmo “uma comissão tripartida” que permita “diálogo franco com a ADENE”. Para o responsável é “fundamental desburocratizar e resolver o desafio do tempo”, lembrando que “podemos hoje levar muitos anos a licenciar uma casa, até 10 anos”, com financiamentos que caducam pelo caminho. Criticou ainda o facto de “o próprio Simplex não nos ter vindo simplificar nada”, pelo menos do ponto de vista das Ordens, e apontou incoerências nos procedimentos municipais, explicando que, embora “a ADENE nos permita o pré-certificado para a licença de construção, há câmaras que não aceitam o licenciamento sem o certificado”, sendo que “de câmara para câmara, há procedimentos diferentes”.
Por seu lado, Rui Fragoso lembrou que Portugal “tem desafios similares à Europa nos nZEB, mas tem um contexto particular”. Explicou que os objetivos são comuns, mas que o país tem “um stock de edifício antigo, ineficiente, taxas de renovação profunda baixa”, o que torna “desafiante” atingir as metas para 2050 nestas condições, num contexto em que “temos o mesmo desafio da mão-de-obra”. Assinalou ainda que Portugal tem “um clima particular moderado, mas mais sujeito à vulnerabilidade climática”, com “forte contributo de energias renováveis”, embora com “questões de segurança energética” e “capacidade financeira das famílias limitada”. O responsável sublinhou que “temos de aproveitar o que temos de bom”.