opinião

AVALIAÇÃO DO IMPACTO DE CARUNCHO PEQUENO EM ESTRUTURAS ANTIGAS DE MADEIRA

AVALIAÇÃO DO IMPACTO DE CARUNCHO PEQUENO EM ESTRUTURAS ANTIGAS DE MADEIRA
João Luís Parracha
Investigador no LNEC | Antigo aluno da NOVA School of Science and Technology | FCT NOVA

Nas últimas décadas do século XX, os incentivos foram, de facto, para a construção nova e nessa altura foi visível um aumento significativo do número de edifícios de habitação em Portugal. Desde o início do século XXI que o panorama se tem alterado com o aumento do número de obras de reabilitação, que já contabilizam, de acordo com dados do INE de 2016, 31% do total dos edifícios concluídos. Os elevados níveis de construção nova verificados no passado, refletem-se agora na existência de inúmeros edifícios antigos, que não foram alvo de ações de manutenção periódicas ao longo do tempo e, por isso, apresentam problemas ao nível estrutural e dos revestimentos. Para fazer face a essa situação, é fundamental reabilitar de forma ponderada, observando dois princípios: a manutenção dos materiais originais sempre que possível e o conhecimento aprofundado por parte dos técnicos responsáveis das técnicas de construção utilizadas à época. A decisão de intervir num edifício deve passar, então, por uma avaliação rigorosa do seu estado de degradação, respeitando-se sempre a identidade cultural e o valor histórico do edifício intervencionado.

A madeira, apesar de ser um material de construção tradicional, continua a possuir um comportamento de certa forma desconhecido para muitos dos intervenientes no processo de construção e de reabilitação, quer devido à grande diversidade de espécies florestais existentes, quer pelo facto de, tratando-se de um material natural, estar sujeito a variações consideráveis nas suas propriedades físicas, mecânicas e de durabilidade. Para além disso, a madeira pode ser sujeita a degradação devido à ação de agentes biológicos (p. ex. fungos, insetos xilófagos), o que faz com que as suas propriedades resistentes diminuam ao longo do tempo e a análise estrutural se torne mais complexa. No que diz respeito à normalização, esta é quase inexistente em relação à regulação de intervenções em estruturas de madeira. Todos estes aspetos contribuem para que a avaliação das propriedades mecânicas dos elementos estruturais de madeira seja bastante complexa. No caso de estruturas antigas de madeira, com interesse histórico, a avaliação da segurança existente torna-se ainda mais difícil, na medida em que, usualmente, não é possível a recolha de amostras in situ da estrutura para posterior realização de ensaios diretos de caracterização mecânica. Nestes casos, normalmente, a abordagem é a de se atribuir valores médios de propriedades mecânicas para esses elementos, com base numa classificação visual, ou recorrer-se a ensaios não destrutivos ou semi

destrutivos (se possível) in situ de avaliação da qualidade da madeira. No entanto, tais procedimentos de avaliação são ainda limitados. O objetivo principal da dissertação “Avaliação do impacto de caruncho pequeno em estruturas antigas de madeira” foi o de se desenvolver um método de avaliação semi destrutiva de elementos estruturais de madeira antiga degradados devido à ação de carunchos pequenos.

Numa primeira fase, realizou-se uma extensa campanha experimental em 216 provetes para se avaliar as propriedades mecânicas de provetes com degradação natural e com degradação artificial. O objetivo da degradação artificial foi o de, conhecendo-se a perda de massa volúmica destes provetes, resultante da “degradação”, conseguir obter-se valores de resistências nos ensaios mecânicos que fossem semelhantes aos obtidos para os provetes com degradação natural. Se isto fosse possível, uma correlação seria estabelecida entre um qualquer parâmetro de avaliação mecânica e a perda total de massa volúmica, para os provetes com degradação artificial. Esta correlação seria, mais tarde, generalizada para os provetes com degradação natural. Concluiu-se, no entanto, que os provetes com degradação artificial apresentaram valores médios de resistência significativamente superiores aos provetes com degradação natural. Este facto comprova dois aspetos: a simulação da degradação não foi bem conseguida; a degradação existente num dado elemento de madeira não deve ser generalizada com base na degradação superficial que este apresenta.

Numa segunda fase e numa tentativa de se conhecer o valor da perda de massa volúmica decorrente do processo de degradação da madeira, recorreu-se à técnica de micro tomografia computadorizada. Com a aplicação desta técnica foi possível quantificar-se a perda de massa volúmica para uma dada amostra de madeira degradada. Problema resolvido! Na fase final da dissertação, desenvolveu-se o método de avaliação do impacto da ação de caruncho pequeno em estruturas de madeira. Considerou-se um ensaio semi destrutivo de arrancamento de um parafuso e realizaram-se ensaios mecânicos de arrancamento perpendicular às fibras e de corte paralelo às fibras. A possibilidade de prever as propriedades da madeira através da aplicação da técnica foi discutida com base em modelos simples de regressão linear. Correlacionou-se a perda das propriedades mecânicas do elemento com a perda de massa volúmica existente e, consequentemente, a perda de massa volúmica com a resistência residual ao corte paralelo do elemento degradado. Foi proposta, então, uma ferramenta de intervenção mínima in situ para a avaliação do estado e qualidade da madeira existente.

A presente dissertação de mestrado foi realizada no âmbito do projeto DB-HERITAGE (Base de dados de materiais de construção com interesse histórico e patrimonial – PTDC/EPH-PAT/4684/2014) e deu origem a uma publicação em congresso nacional, uma publicação em congresso internacional, uma publicação em revista científica internacional indexada e uma

publicação em poster com apresentação em congresso internacional. A dissertação foi agora distinguida com uma Menção Honrosa do Prémio APRUPP 2020.

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